Lição 3 – Autoridade Redentora de Cristo

cross

Filipenses 2.5-11

De sorte que haja em vós o mesmo sentimento que houve também em Cristo Jesus,

Que, sendo em forma de Deus, não teve por usurpação ser igual a Deus,

Mas esvaziou-se a si mesmo, tomando a forma de servo, fazendo-se semelhante aos homens;

E, achado na forma de homem, humilhou-se a si mesmo, sendo obediente até à morte, e morte de cruz.

Por isso, também Deus o exaltou soberanamente, e lhe deu um nome que é sobre todo o nome;

Para que ao nome de Jesus se dobre todo o joelho dos que estão nos céus, e na terra, e debaixo da terra,

E toda a língua confesse que Jesus Cristo é o Senhor, para glória de Deus Pai.

1 Timóteo 2.5,6

Porque há um só Deus, e um só Mediador entre Deus e os homens, Jesus Cristo homem.

O qual se deu a si mesmo em preço de redenção por todos, para servir de testemunho a seu tempo.

Texto Áureo

Mateus 28.18

E, chegando-se Jesus, falou-lhes, dizendo: É-me dado todo o poder no céu e na terra.

 

A doutrina do auto-esvaziamento ou kenosis deriva do verbo ἐκένωσεν (aoristo do verbo κενóω = tornar vazio, privar de força, esvaziar, aniquilar), usado em Filipenses 2.7 pelo apóstolo Paulo para identificar a atitude de Cristo de não ter se valido da sua natureza divina, antes dela se auto-esvaziou, assumindo a forma de servo e, tornando-se semelhante aos homens, a si mesmo se humilhou, obedecendo até à morte na cruz.

Conceituar, explicar a natureza, a extensão e as implicações do auto-esvaziamento não é tarefa fácil, especialmente por estar ligada a dois outros aspectos da Cristologia: a encarnação (o verbo que se fez carne) e a união hipostática (a dupla natureza, divina e humana). Tanto é, que os três assuntos (kenosis, encarnação e união hipostática) têm sido objeto de discussão durante toda a era cristã e, em conjunto, têm servido como base para a formulação de inúmeras teorias.

Paulo exalta a humildade de Cristo de não ter lançado mão da sua condição de subsistência em forma de Deus, antes ter aberto mão dos direitos divinos que lhe eram implícitos. Cristo não desejou arrebatar ou apoderar-se da igualdade com Deus, mas recusou-se a auferir qualquer vantagem dela decorrente.

Normalmente, o ser humano vive para satisfazer seus desejos, sonhos e planos e, para tanto, emprega com muito afinco e dedicação sua força, capacidade e talentos. Usar tais atributos para um propósito que exceda seu próprio interesse é muito difícil, mesmo que seja um propósito maior e mais nobre.

Pensar a mesma coisa, ter o mesmo amor e sentir o mesmo, ser unido na alma, nada fazer por partidarismo ou vanglória, mas por humildade, considerar o outro superior e não ter em vista o que é propriamente seu, senão também o que é do outro, tudo isto implica em renúncia, em abrir mão daquilo que muitas vezes reputamos ter de mais valor: ideologias, sentimentos, razão, status e bens.

Olhando para o exemplo de Cristo, vemos que Ele não renunciou apenas algo que possuía. Ele não renunciou apenas seus interesses, direitos, planos, sonhos ou desejos. Ele renunciou tudo o que era. Ele renunciou seu próprio ser. Ele renunciou sua própria vida e passou a viver não mais para si mesmo, mas para os outros, que sequer mereciam isso.

Abrir mão dos seus direitos divinos foi condição essencial para que Jesus pudesse desempenhar com sucesso sua missão na terra. Aliás, foi movido por uma astúcia impressionante que satanás tentou o Senhor a transformar pedras em pães (Mt. 4.3). Caso tivesse cedido à proposta maligna, o Senhor teria usado seu poder em benefício próprio, para atender seus interesses, comprometendo o resultado final da missão.

Ao exortar os crentes a terem o mesmo sentimento de Cristo, Paulo quis mostrar que o cumprimento da missão de anunciar as virtudes daquele que os chamou das trevas para a sua maravilhosa luz (1 Pe 2.9) depende de uma vida que não objetive a satisfação dos interesses pessoais (Gl 2.20), mas os de Cristo.

Ao esvaziar-se, Cristo assumiu a forma de homem. Ele, que antes era Deus, participante do ato da criação do homem, “rebaixou-se” para assumir a forma de homem.

É interessante pensar que enquanto Adão, criado à imagem e semelhança de Deus, cedeu à tentação ilusória de tomar para si um direito que não lhe pertencia, que era a igualdade com Deus (Gn 3.1-5), o Deus-Filho abriu mão da sua natureza divina para tornar-se homem, se identificando com a humanidade não redimida. Enquanto Adão buscou a exaltação tentando se tornar divino, Cristo foi exaltado justamente por ter se tornado humano.

Infelizmente, a humildade de considerar-se inferior aos demais ou de reconhecer a sua posição diante de Deus é uma virtude que tem sido desprezada em nossos dias, sendo cada vez mais rara de ser encontrada, mesmo dentro dos arraiais cristãos.

É comum encontrarmos pessoas exigindo ou determinando a Deus a concessão de um direito que supostamente possuem. Talvez essas pessoas não tenham percebido que sua atitude pretende reduzir Deus à condição de servo, sempre pronto a atender os caprichos do seu amo.

O fato de sermos o alvo das bênçãos celestiais conquistadas por Jesus na cruz (Ef. 1.3) não nos dá o direito de exigir algo de Deus. O fato de Deus ter nos amado sobremaneira (Jo 3.16) e seu Filho ter se tornado como um de nós não inverte a relação de senhorio, de modo que O Deus Todo-Poderoso, Criador dos céus e da terra, tenha se tornado um humilde servo da criatura!!

Talvez muitas pessoas não tenham atentado para o fato de que sua atitude as lança exatamente no mesmo ponto em que Adão estava e que precedeu à queda, ou seja, o desejo de ser como Deus.

Há ainda outro aspecto da humildade de Cristo e que diz respeito ao exercício de autoridade e poder, segundo o padrão deixado por Cristo. Como a carta aos Filipenses também foi dirigida aos líderes da igreja (1.1), podemos aplicar o exemplo de humildade de Jesus a todos aqueles que, de uma maneira ou de outra, exercem influência sobre a vida de outros no ambiente eclesiástico.

Conforme registra Mateus 20.25-28, após o pedido da mãe de Tiago e João para que seus filhos se assentassem, um à direita e o outro à esquerda de Jesus em seu Reino, o Mestre ensinou que entre os seus o padrão a ser seguido é: quem quiser tornar-se grande, seja o servo dos demais; e quem quiser ser o primeiro, seja o último.

Jesus explica que o padrão por Ele adotado em sua missão redentora: Ele veio ao mundo para servir e não para ser servido e, por isso mesmo, Deus o exaltou sobremaneira e lhe deu um nome que está acima de todo o nome. Um padrão completamente oposto do que temos visto ultimamente, segundo o qual homens autodenominados líderes se valem do poder e autoridade em benefício próprio, almejando serem servidos pelos liderados, enquanto deveriam se dedicar a servi-los.

Se o próprio Deus deixou a sua glória e se humilhou para se tornar homem, que direito tem o homem de se considerar superior aos seus semelhantes, mesmo que tenha recebido do próprio Deus uma posição proeminente de liderança e autoridade?

No Reino, não há um homem no centro do poder, mas unicamente o Senhor Jesus, a quem todos devem desejar servir. Qualquer ação diferente é abuso de autoridade e poder e desprezo ao exemplo de humildade deixado por Cristo.

Filipenses 2.5-11 também fala da humildade de Cristo demonstrada do ato de obedecer até à morte, e morte de cruz. Aliás, a ênfase na morte de cruz revela que ela constituiu um dos pontos mais baixos da humilhação de Jesus. Segundo os padrões da época, não havia experiência mais repugnante e degradante (Dt. 21.22-23 e Gl. 3.13).

Aqui cabe um alerta: precisamos também compreender que a sujeição à vontade do Pai pode trazer consequências terríveis e grande sofrimento. Basta ver o exemplo de Cristo: humilhação, dor e morte. Estamos prontos a obedecer como Cristo obedeceu? Será que se Deus nos revelar que nosso futuro será de sofrimento, continuaremos dispostos a obedecê-lo? Eis a verdade, que nada tem a ver com a prosperidade e o triunfalismo que vem sendo pregados por aí.

A vontade do Pai prevaleceu sobre a vontade do Filho (Lc 22.42). Cristo, conhecedor da vontade de Deus, mas sem imposição ou coerção, decidiu se humilhar e obedecer. Ele assim sentiu, assim decidiu e assim o fez e plenamente consciente de que ao fazê-lo, sofreria um castigo que não era seu (Is. 53.5), suportaria a totalidade da ira do Pai (Rm. 5.18) e por Ele seria abandonado (Mt 27.46).

Com a humilhação, Jesus foi exaltado e recebeu um nome que está sobre todo o nome, diante do qual todos os seres, nos céus e na terra, se dobrarão e toda língua confessará que Ele é o Senhor.

Interessante pensar que, apesar do texto dizer que Cristo foi sobremaneira exaltado por Deus, a sua obediência não estava condicionada à recompensa da exaltação, embora o próprio Senhor tenha afirmado que os humilhados serão um dia exaltados (Lc. 14.11). Ele simplesmente obedeceu, sem almejar recompensa alguma.

Entretanto, até mesma a exaltação final e universal de Cristo tem um objetivo bem definido: a glória de Deus Pai (v. 11). Segundo o exemplo e ensino de Cristo, a exaltação pela humilhação é uma consequência natural, mas ela não pode servir como incentivo para a obediência. Esta, pelo contrário, deve ter sempre como objetivo final a glória de Deus.

Aquele que obedece a Deus pensando em uma recompensa final, aquele que se humilha diante da vontade do Pai almejando ser alvo de exaltação, delas não é digno.

Humildade que leva à renúncia e à obediência servil: eis o padrão requerido por Deus, o modelo deixado por Cristo Jesus para todos aqueles que o professam como Senhor e Salvador, em todos os lugares e em todos os tempos.

 

 

 

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